Irã e Brasil. Como o tempo muda no mundo da diplomacia internacional. Parecia ontem que a Turquia, Brasil e Irã anunciaram com grande alarde o negócio de permuta de combustível nuclear destinado a evitar novas sanções da ONU.
Em direção às negociações, Brasil tinha uma clara missão no momento.
Desde que o acordo foi feito, em maio do ano passado, foi comemorado pelos principais envolvidos como um sinal de que a diplomacia internacional é possível - através do desenvolvimento de poderes sem a influência da Europa ou os EUA.
Independentemente do bloqueio do acordo bem-intencionado, a assinatura deste, culminou no que muitos acreditavam nesta época, um longo triângulo de potências diplomáticas entre Turquia-Brasil-Irã - com a Turquia, famosa ponte do mundo Europa-Árabe e o Brasil, fazendo a ponte entre o Norte-Sul da América. No meio, o Irã.
Não foi certamente o debate interno no Brasil, naquele momento, que eventualmente, propiciou o interesse do Brasil em realizar o negócio. Mas, talvez uma relação de conveniência.
Na época, o regime iraniano estava precisando de uma nova “cara”, uma nova e bem vista potência global como aliado e o Brasil se encaixava perfeitamente neste perfil.
Brasil, na época, tinha um presidente muito popular, Luiz Inácio Lula da Silva, que estava procurando expandir a política externa de seu país em grandes questões internacionais.
A questão nuclear iraniana entrou na conta. E para os brasileiros, somando ao peso e à credibilidade regional da Turquia essa mistura fez com que tudo acontecesse.
Dessa forma, a amizade produziu benefícios econômicos, assim como Lula mesmo disse em um discurso em Teerã no ano passado.
Nos últimos oito anos, o intercâmbio comercial entre Irã e Brasil duplicou, passando de US $ 500 milhões para US $ 1,2 bilhão. O Irã é hoje um das três principais parceiros comerciais do Oriente Médio para o Brasil.
Em 2009, mais de 450 empresas brasileiras exportaram para o Irã. E no primeiro semestre de 2010, quando as relações Brasil-Irã foram mais próximas, as exportações brasileiras para o Irã aumentou 77 por cento, enquanto as importações do Irã para o Brasil cresceram 125 por cento.
Mas as coisas mudaram. Lula da Silva está fora do Governo. O influente ex-ministro do Exterior, Celso Amorim (que foi nomeado pela revista Foreign Policy como um dos principais pensadores do mundo) está semi-aposentado no Rio de Janeiro.
E assim também, talvez, é a amizade do Brasil com o Irã.
A dinâmica entre o Brasil e o Irã deu uma guinada súbita e abrupta sob a forma de Dilma Rousseff.
Rousseff reposicionou a política externa do Brasil com o Irã.
A nova presidente do Brasil, em seus quase três meses de presidência, passou longe da política internacional, deixando o atual Ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, como voz principal em todos os assuntos fora do Brasil.
No entanto, mesmo durante a campanha eleitoral, Rousseff sempre que era questionada por repórteres sobre a "questão iraniana", geralmente mencionava duas palavras: "humano" e "direitos".
Sem dúvida, isso fez com que os iranianos se sentissem desconfortáveis.
Semanas atrás, como era de se espera, Rousseff teria sido indiferente com o Irã. O embaixador iraniano disse que a nova presidente estava "mal informada" sobre os acontecimentos em seu país.
Rousseff, que foi torturada em sua juventude nas mãos da ditadura no Brasil e passou a ser a primeira mulher Presidente no Brasil, tinha dado sinais de que queria esfriar as relações com o Irã. Refrigeração? Não. Ela agora parece estar jogando um balde de água gelada sobre a relação. Congelando-o.
No mais recente sinal da nova postura brasileira sobre o Irã, o Brasil votou nesta quinta-feira no Conselho de Direitos Humanos da ONU para autorizar uma resolução que institui um relator especial para investigar possíveis violações dos direitos humanos no Irã.
É a primeira vez em uma década que o Brasil votou a favor de algo significativo e que contraria o atual governo iraniano.
(Algumas pessoas estão céticas. Como um dos meus seguidores no Twitter brasileiro que me enviou uma mensagem: "O Brasil muda de curso sobre o Irã, mas ainda reconhece Kadafi e outros ditadores que são ainda piores nos direitos humanos.")
Talvez Irã já esperava por isso.
Certamente Teerã sabia que, se o candidato da oposição nas eleições do ano passado – o ex-governador paulista José Serra – tivesse vencido a eleição, ele certamente teria colocado os freios sobre as relações com o Irã mais rápido e mais duro do que Dilma.
Vamos ser claros: o Irã não se beneficiou muito do Brasil, mas de Lula da Silva, o homem, uma figura política histórica brasileira que levou a política externa de seu país a lugares que nunca tinha estado antes com tal autoridade (Irã, Palestina, África...).
O problema para o Irã - que estão agora descobrindo - é que figuras como Lula da Silva não circulam com freqüência.
E Brasil em 2011, é um lugar onde a opinião de Lula da Silva não importa muito mais. A opinião de Dilma sim. E sua opinião sobre esse assunto é bastante clara.
No entanto, Dilma Rousseff - ex-ministra chefe da casa civil - continua a ser uma firme aliada e amiga de Lula (eles irão viajar juntos para Portugal na próxima semana).
Sem Lula e seus impressionantes 78 por cento de aprovação durante a campanha do ano passado, há dúvidas se ela seria mesmo a presidente hoje.
Rousseff raramente discorda de seu ex-chefe em qualquer coisa. Irã é uma grande exceção.
Daqui pra frente, como será o relacionamento entre Irã e Brasil?
É uma incógnita. Mas certamente não voltará a ser como antes. Pelo menos não enquanto Rousseff for presidente.
Washington deve estar sorrindo.
Neste post: A opinião expressa pelo autor é de sua exclusiva responsabilidade, e não retratam, necessariamente, a opinião da autora deste blog. Principalmente quando o autor fala que a opinião de lula não importa mais.