sexta-feira, 25 de março de 2011

Lenta ruptura do Brasil com Irã






Irã e Brasil. Como o tempo muda no mundo da diplomacia internacional. Parecia ontem que a Turquia, Brasil e Irã anunciaram com grande alarde o negócio de permuta de combustível nuclear destinado a evitar novas sanções da ONU.

Em direção às negociações, Brasil tinha uma clara missão no momento.

Desde que o acordo foi feito, em maio do ano passado, foi comemorado pelos principais envolvidos como um sinal de que a diplomacia internacional é possível - através do desenvolvimento de poderes sem a influência da Europa ou os EUA.

Independentemente do bloqueio do acordo bem-intencionado, a assinatura deste, culminou no que muitos acreditavam nesta época, um longo triângulo de potências diplomáticas entre Turquia-Brasil-Irã - com a Turquia, famosa ponte do mundo Europa-Árabe e o Brasil, fazendo a ponte entre o Norte-Sul da América. No meio, o Irã.

Não foi certamente o debate interno no Brasil, naquele momento, que eventualmente, propiciou o interesse do Brasil em realizar o negócio. Mas, talvez uma relação de conveniência.

Na época, o regime iraniano estava precisando de uma nova “cara”, uma nova e bem vista potência global como aliado e o Brasil se encaixava perfeitamente neste perfil.

Brasil, na época, tinha um presidente muito popular, Luiz Inácio Lula da Silva, que estava procurando expandir a política externa de seu país em grandes questões internacionais.

A questão nuclear iraniana entrou na conta. E para os brasileiros, somando ao peso e à credibilidade regional da Turquia essa mistura fez com que tudo acontecesse.

Dessa forma, a amizade produziu benefícios econômicos, assim como Lula mesmo disse em um discurso em Teerã no ano passado.

Nos últimos oito anos, o intercâmbio comercial entre Irã e Brasil duplicou, passando de US $ 500 milhões para US $ 1,2 bilhão. O Irã é hoje um das três principais parceiros comerciais do Oriente Médio para o Brasil.

Em 2009, mais de 450 empresas brasileiras exportaram para o Irã. E no primeiro semestre de 2010, quando as relações Brasil-Irã foram mais próximas, as exportações brasileiras para o Irã aumentou 77 por cento, enquanto as importações do Irã para o Brasil cresceram 125 por cento.

Mas as coisas mudaram. Lula da Silva está fora do Governo. O influente ex-ministro do Exterior, Celso Amorim (que foi nomeado pela revista Foreign Policy como um dos principais pensadores do mundo) está semi-aposentado no Rio de Janeiro.

E assim também, talvez, é a amizade do Brasil com o Irã.

A dinâmica entre o Brasil e o Irã deu uma guinada súbita e abrupta sob a forma de Dilma Rousseff.

Rousseff reposicionou a política externa do Brasil com o Irã.

A nova presidente do Brasil, em seus quase três meses de presidência, passou longe da política internacional, deixando o atual Ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, como voz principal em todos os assuntos fora do Brasil.

No entanto, mesmo durante a campanha eleitoral, Rousseff sempre que era questionada por repórteres sobre a "questão iraniana", geralmente mencionava duas palavras: "humano" e "direitos".

Sem dúvida, isso fez com que os iranianos se sentissem desconfortáveis.

Semanas atrás, como era de se espera, Rousseff teria sido indiferente com o Irã. O embaixador iraniano disse que a nova presidente estava "mal informada" sobre os acontecimentos em seu país.

Rousseff, que foi torturada em sua juventude nas mãos da ditadura no Brasil e passou a ser a primeira mulher Presidente no Brasil, tinha dado sinais de que queria esfriar as relações com o Irã. Refrigeração? Não. Ela agora parece estar jogando um balde de água gelada sobre a relação. Congelando-o.

No mais recente sinal da nova postura brasileira sobre o Irã, o Brasil votou nesta quinta-feira no Conselho de Direitos Humanos da ONU para autorizar uma resolução que institui um relator especial para investigar possíveis violações dos direitos humanos no Irã.

É a primeira vez em uma década que o Brasil votou a favor de algo significativo e que contraria o atual governo iraniano.

(Algumas pessoas estão céticas. Como um dos meus seguidores no Twitter brasileiro que me enviou uma mensagem: "O Brasil muda de curso sobre o Irã, mas ainda reconhece Kadafi e outros ditadores que são ainda piores nos direitos humanos.")

Talvez Irã já esperava por isso.

Certamente Teerã sabia que, se o candidato da oposição nas eleições do ano passado – o ex-governador paulista José Serra – tivesse vencido a eleição, ele certamente teria colocado os freios sobre as relações com o Irã mais rápido e mais duro do que Dilma.

Vamos ser claros: o Irã não se beneficiou muito do Brasil, mas de Lula da Silva, o homem, uma figura política histórica brasileira que levou a política externa de seu país a lugares que nunca tinha estado antes com tal autoridade (Irã, Palestina, África...).

O problema para o Irã - que estão agora descobrindo - é que figuras como Lula da Silva não circulam com freqüência.

E Brasil em 2011, é um lugar onde a opinião de Lula da Silva não importa muito mais. A opinião de Dilma sim. E sua opinião sobre esse assunto é bastante clara.

No entanto, Dilma Rousseff - ex-ministra chefe da casa civil - continua a ser uma firme aliada e amiga de Lula (eles irão viajar juntos para Portugal na próxima semana).

Sem Lula e seus impressionantes 78 por cento de aprovação durante a campanha do ano passado, há dúvidas se ela seria mesmo a presidente hoje.

Rousseff raramente discorda de seu ex-chefe em qualquer coisa. Irã é uma grande exceção.

Daqui pra frente, como será o relacionamento entre Irã e Brasil?

É uma incógnita. Mas certamente não voltará a ser como antes. Pelo menos não enquanto Rousseff for presidente.

Washington deve estar sorrindo.

Neste post: A opinião expressa pelo autor é de sua exclusiva responsabilidade, e não retratam, necessariamente, a opinião da autora deste blog. Principalmente quando o autor fala que a opinião de lula não importa mais.

3 comentários:

  1. O que eu lamento é que neste momento qualquer apoio de críticas ao Irã é fazer o jogo dos EUA visando desacreditar o Irã para viabilizar uma possível futura ação militar que possibilite o contrôle do petróleo. Porque a Dilma não levanta também a questão sobre os direitos humanos na Arábia Saudita? sem falar nas demais ditaduras muçulmanas apoiadas pelos EUA. Acho que a Dilma fez o jogo dos EUA, infelizmente. Saudades da dupla Lula/Celso Amorim.

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  2. Ovidio,
    Dilma não só fez o jogo dos Estados Unidos como humilhou o povo brasileiro com essa subserviência ridícula. Como se precisássemos disso.
    Compartilho do seu sentimento: "saudades da dupla Lula/Celso Amorim".

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  3. Pelo contrario quem não deve não teme! Essa comitiva investigatória veio em boa hora acredito inclusive que lula foi ingênuo em acreditar que um extremista como Armadnejad quer esse urânio para o bem coletivo, não é por acaso que lula é tão popular, colocar um país na mão de pessoas idôneas é como colocar um revolver na mão de uma criança (pode causar danos a muita gente).

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Obrigada por interagir.
Daniele El Seoudi.

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